Bócio: tireóide aumentada de tamanho

A tireóide, glândula situada na região cervical anterior, foi descrita pela primeira vez com detalhes anatômicos pelo genial artista, pensador, inventor e filosofo Leonardo da Vinci.
O desenho de Leonardo mostra a glândula tireóide em forma de "borboleta", situada entre as duas artérias que levam o sangue para o cérebro (carótidas). Naquela ocasião, século XVII, pouco (ou nada) se sabia das funções desta importante glândula.
Mas o conhecimento de que a tireóide podia mostrar-se aumentada, volumosa, fazendo-se saliente no pescoço é muito antigo. Os chineses já sabiam que em regiões montanhosas do país muitas pessoas tinham o "pescoço grosso, entumescido".
A medicina chinesa tratava estes pacientes com "esponja do mar", que hoje sabemos conter iodo.
Um historiador romano, Juvenal, ao acompanhar as tropas do exército romano que partiam para consolidar a conquista de Gália, observou que os habitantes dos Alpes apresentavam grande volume no pescoço -- chamado "Guttur", vocábulo em latim que deu origem ao termo "goiter, goitre".
Em português chama-se bócio ou papo. Somente no século XIX, após descoberta do iodo (1805), é que se aventou a hipótese de que regiões montanhosas, longe do mar, poderiam ter falta de iodo, o que levaria a glândula tireóide a crescer.

A descoberta do iodo e sua deficiência

A capacidade de observação de Napoleão Bonaparte estabeleceu um vínculo inicial entre a presença de bócio nos Alpes e a ausência dele em regiões junto ao mar. Napoleão indagou ao seu médico particular, Corvisart, por que nas regiões alpinas tantos rapazes sadios e fortes eram recusados para servir o exército francês por causa de "tumor" no pescoço. Ao mesmo tempo, mencionou que os habitantes de sua Córsega natal, em Marselha e áreas junto ao mar, este tipo de "anomalia" não existia.
Claro que Corvisart nada sabia do iodo ou da deficiência de iodo nas montanhas. Mas decorridos alguns anos, a descoberta do iodo e sua conexão com a tireóide passou a ser mais clara. A Suíça, país rodeado de montanhas, apresentava enorme prevalência de bócio em seus habitantes. Pequenas comunidades encravadas nos Alpes tinham mais de 80% dos seus habitantes com bócio.
Em Genebra, um médico local teve a idéia de dar gotas de solução de iodo às pessoas que sofriam com esse problema. Notou logo uma apreciável redução do bócio. Em 1830, já se sabia que a deficiência de iodo era a grande causa do aparecimento de bócio em populações alpinas.
A falta de iodo torna impraticável para a tireóide produzir os seus hormônios, T3 e T4. Isto porque esses dois hormônios possuem, respectivamente, três moléculas e quatro moléculas de iodo em sua estrutura química.
Com a falta de iodo e, conseqüentemente, menor produção de T3 e T4, a glândula hipófise produz um hormônio chamado de estimulante da tireóide (TSH) em enormes quantidades na tentativa de induzir a tireóide superestimulada a fazer mais T3 e T4.Com tanta estimulação por TSH, a glândula tireóide cresce continuadamente. No começo é um crescimento ordenado, com amplo aumento das unidades funcionais da tireóide (os folículos).
Depois, a contínua carência de iodo leva ao crescimento desordenado, que propicia a formação de nódulos e após várias décadas de falta de iodo temos o bócio com muitos nódulos (Bócio Multinodular).

O Bócio Multinodular deve ser tratado

O tratamento com iodo, que data desde o início do século XIX, tem os seus riscos. Acontece que o grande volume do bócio pode dar origem a um excesso de formação e liberação de hormônios tireóideos (T3 e T4) com o surgimento de hipertireoidismo por iodo. Tal fato pode levar a taquicardia, arritmias cardíacas, perda de massa muscular e outros sintomas Outra forma de tratar o bócio é tentar "segurar" a hipófise que secreta o TSH, hormônio estimulante da tireóide.
O raciocínio é simples: podemos administrar L-Tiroxina (T4), pela manhã, em jejum, e este hormônio da tireóide irá bloquear o TSH. Sem estímulo de TSH, o bócio tende a regredir, mas de forma lenta. Assim, seriam necessários anos de terapêutica para obter resultados animadores. Mais recentemente passou-se a usar o iodo radioativo.
Como o próprio nome indica, esta substância, produzida em reatores nucleares, é absorvida pela tireóide e uma vez incorporado à glândula emite radiações que destróem as unidades funcionais da tireóide (folículos), reduzindo, rápida e drasticamente, o volume do bócio.
Em um a dois anos após administração de iodo radioativo, o bócio decresce mais de 50% do volume inicial. Todavia, um terço dos pacientes passa a ter hipotireoidismo, isto é, falta da função da tireóide, como conseqüência da terapêutica radioativa.

E a cirurgia do bócio?

A cirurgia do bócio iniciou-se no século XIX e se tornou uma das cirurgias mais executadas tanto na Europa como nos Estados Unidos.
Hoje, com os cuidados anestésicos, a perícia de cirurgiões especializados e preparo adequado do paciente, a remoção do Bócio Multinodular é exeqüível, com ótimos resultados e raras complicações.
A cirurgia permite rápida correção do Bócio Multinodular, mas alguns pacientes idosos já com doença cardíaca e arritmias podem ter a opção de ser tratados com iodo radioativo, que não tem riscos cirúrgicos e anestésicos e é simples de ser executado.

Fonte: Prof. Dr. Geraldo Medeiros Neto - nov 2007

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